quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Trechos de um canal ruim

Eu era só uma criança
quando vi a guerra na TV
O mocinho atacava incansável
seus dragões de fogo espetaculares
escapavam do radar, cruzavam a noite
mesmo na escuridão total
O fogo chegava no alvo final
Hospitais, parques, crianças.
Belgrado é aqui do lado

Eu já era mais velho
quando vi a morte na internet
ao alcance de um clique
caos online ao alcance da mão
buscando um suposto culpado
mas nada foi provado
Nenhuma organização que explique
o bombardeio de uma nação
Bagdá é mais pra cá

Li no livro de história
Sobre o agente laranja
E o custo bilionário de bombas
Que nunca destruíram a esperança
Na ofensiva do Tet
O Vietnã virá amanhã

Agora ligo a TV
Ou um rádio me diz
A barbárie é tão próxima
Na cidade que parece feliz
tá mais difícil sorrir
O Haiti é aqui

terça-feira, 19 de novembro de 2024

Manhã

No mesmo trilho segue o trem
Monótono ou ritmado
indo sempre ao mesmo lugar
mas ainda é tão cedo

Gente mau humorada na outra estação
vivendo no mundo do seu celular
o futuro distópico dá medo
lá onde não quero estar

O trilho treme o trem
mesmo preso no dormente
não afeta a essa gente
que vão e nem sei de onde vêm

A alavanca vermelha na parede
fala sobre situações de emergência
como usuário preso na porta
acidente ou coisa assim

Quero declarar uma urgência
e usar a alavanca enfim
para parar a mesmice do dia
e fugir da realidade torta

já são oito da manhã
e o trem está lotado
de gente que nem queria estar aqui
uma paranoia coletiva

bater o ponto e viver apressado
sem expectativa de fugir
a não ser pela porta que entrou
vivendo numa apatia passiva

Saem pessoas, entram pessoas
talvez nunca mais veja ninguém
eu não gravei suas caras
são como vultos na multidão

será que sou alguém
fechado nessa minha ilusão
vivendo uma vida à toa
enquanto o tempo passa

quinta-feira, 28 de março de 2024

Permanência

Por muito tempo eu quis
Ser outra pessoa
Alguém que eu julgava melhor

Calcei os sapatos azuis
Embarquei naquela canoa
E derramei o meu suor

Anos gastos no túnel
Sem ver direito a luz
Como uma grande miopia
Esperando chegar o dia

Corri para ser alguém
Vivi os anseios dos outros
E meus sonhos eram poucos

Um dia acordei e olhei as cortinas
Decidi encarar o mundo
As ruas e suas esquinas
Explorar a alma a fundo

A expectativa alheia
Não é mais meu farol
Agora busco meu próprio sol
E minha lua cheia

Tenho um penteado novo
que incomoda alguma gente
mas sigo indiferente

Tenho um novo pensamento
Que irá me levar longe
E pode durar um momento

Mesmo quando as máquinas dormem
Eu continuo aqui
Não posso desistir de mim

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Rá! E cai

Nem nuvem no céu azul com o calor que faz tenho medo de rimar

O Sol vem todos os dias Só vem para queimar A manhã que nasce amena Na manha se põe sem pena mas amanhã vem brilhar


Não escrevo pra salvar vidas 

Nem minha nem de ninguém

nem me atrevo a posar de herói 

e pintar um quadro que não convém 

quero é o caos das verdades caídas 

homens maus que enganam por enganar

Sou talvez aquela noite escura de lua nova e sem estrelas 

Cave a cova sem que possa vê-la 

Um lamento, muxoxo, lamúria