Por muito tempo eu quis
Ser outra pessoa
Alguém que eu julgava melhor
Calcei os sapatos azuis
Embarquei naquela canoa
E derramei o meu suor
Anos gastos no túnel
Sem ver direito a luz
Como uma grande miopia
Esperando chegar o dia
Corri para ser alguém
Vivi os anseios dos outros
E meus sonhos eram poucos
Um dia acordei e olhei as cortinas
Decidi encarar o mundo
As ruas e suas esquinas
Explorar a alma a fundo
A expectativa alheia
Não é mais meu farol
Agora busco meu próprio sol
E minha lua cheia
Tenho um penteado novo
que incomoda alguma gente
mas sigo indiferente
Tenho um novo pensamento
Que irá me levar longe
E pode durar um momento
Mesmo quando as máquinas dormem
Eu continuo aqui
Não posso desistir de mim
quinta-feira, 28 de março de 2024
Permanência
quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024
Rá! E cai
Nem nuvem no céu azul com o calor que faz tenho medo de rimar
O Sol vem todos os dias Só vem para queimar A manhã que nasce amena Na manha se põe sem pena mas amanhã vem brilhar
Não escrevo pra salvar vidas
Nem minha nem de ninguém
nem me atrevo a posar de herói
e pintar um quadro que não convém
quero é o caos das verdades caídas
homens maus que enganam por enganar
Sou talvez aquela noite escura de lua nova e sem estrelas
Cave a cova sem que possa vê-la
Um lamento, muxoxo, lamúria
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023
Desabafo
Pode estar em todo canto
A tal da poesia
Numa dor e seu pranto
E também numa alegria
Mas pode estar também
Em lugares ainda menores
na espera de dias melhores
Sem saber muito bem
Nada parece acontecer
que salve esse mundo do caos
se somos todos ou muitos maus
talvez morramos sem saber
quando eu pego a caneta
para rabiscar no papel
é sempre viagem às cegas
onde estou não sei onde vou
ao contrário dos trilhos desse metrô
que anda decidido como o planeta
como se o destino fosse revel
Correm os minutos e estou atrasado
só esperando o aviso da estação
ainda é cedo e estou cansado
pera - a rima era desmotivado
é o que sente o meu coração
corremos mais que o relógio de ponto
que ameaça me pegar
escrevo isso que nem é conto
E não alivia o peso de existir
Ao contrário, faz pensar mais
se não te faz desistir
te faz sofrer e esperar
a vida já pesa demais
lembro de uma música que diz
ignorância é bênção
sem saber de nada, talvez
sem querer aprender
deve ser mais fácil ser feliz
evitando a palavra não e senão
sem saber o que dizer
mas eu me questiono todo dia
e por isso duvido de mim
não queria que fosse assim
só queria ser mais satisfeito
contente com isso e confiante
mas parece que me odeio
ou muita gente pensa isso
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023
Andar
Falo
Falo muito pouco
Ouço
Tanto e fico rouco
Em dias sempre iguais
Problemas alheios atuais
Sempre os mesmos
Apertados numa folha de papel
Torre de babel
Como o metrô lotado
o ônibus apertado
o espaço é caro
conforto é raro
Passo meus dias fechado
no conforto opressivo dessa sala
paredes brancas que não dizem nada
burocratas de rosto fechado
papéis inúteis, carimbados
todo mundo é filho de alguém
aqui viram números guardados
no frio do ar condicionado
Relegados a serem ninguém
assim como estou aqui e agora
sem saber se ainda sou um quem
entre paredes sempre brancas
um mundo morto sem cor
anestesiado pra não sentir dor
às vezes pensando em fugir
como pássaro voar
do décimo terceiro andar
terça-feira, 31 de janeiro de 2023
Reminiscência
Passo dias sonhando acordado
vivendo vidas que nunca vivi
Penso estar preso no passado
mas é ilusão e caí
Imagino rumos que poderia ter ido
Seguindo sonhos inocentes de criança
Indo em frente cheio de esperança
Mas foi caminho perdido
Nunca pude voar com asas cortadas
Sem encarar a tesoura que cortou
talvez invejando quem um dia voou
quem ganhou o mundo por essas estradas
sem paradas atrás dos rumos da vida
talvez não achando a volta, mas longe da ida
E eu fiquei confortável no chão
Na segurança do medo de altura
que me disseram - é prudente ter
pois não convém viver
uma vida de tanta loucura
bobagem criar essa ilusão
pois sonhar é caro demais
melhor viver no chão sem nada de mais
hoje eu olho a mesma parede branca
e chamam de vitória
eu não escrevi minha história
aceitei aquela dócil tranca
hoje eu conto piada
e todos julgam que sou feliz
mas parece que ninguém diz
sobre a minha risada
vejo o céu bem azul lá fora
mas aqui dentro segue gelado
como ele, sigo condicionado
vezes entediado, outras mau-humorado
quase sempre esperando a hora
um dia fui criança e sonhei
a vida dos sonhos que viveria
hoje, adulto, sem aquela alegria
digo que nunca me achei
ou me achei numa rua dessa cidade
sobrevivendo na mediocridade
o que sai da caneta nem faz sentido
é visão amargurada do passado
do que eu queria e deu tudo errado
talvez nem devia ter dito
pra não repensar o não vivido
para não viver amargurado
Também não posso dizer
que tudo é tão ruim assim
boas coisas que acontecem pra mim
e seria injusto esconder
tenho pra onde ir no fim do dia
me esconder desse mundo mesquinho
ter compreensão e carinho
num potinho de alegria
descansar apesar de tudo
e sonhar com algo melhor
que pode haver bem maior
mesmo que os dias sejam iguais
parados, e isso não significa paz
não escrevo buscando notoriedade
isos fica para os que voam alto
pássaros do outro lado da cidade
os que voam nos aeroportos
os que ficam no chão como patos
são lembrados só depois de mortos
quarta-feira, 30 de março de 2022
Recortes
Paredes brancas por toda parte
Lisas, alvas, sem personalidade
Não querem me dizer nada
Não querem que eu pense em nada
Que siga uma rotina mesmo sem vontade
Vou gastando os melhores anos da vida
Passa um dia - passa uma tarde
Qual a sua idade?
Onomatopeias de máquinas eletrônicas
Bater o ponto no mesmo horário
Viver refém do maquinário
E ter como melhor amigo o microondas
Alucinações polifônicas
Meus amigos não vejo mais
Mas vejo desconhecidos
Que entram e saem, perdidos
E como se fossem meus companheiros
Vem e vão de volta ao anonimato
Uma tentativa, revolta, apelo
E segue o ritmo dos ponteiros
Tic-tic-tic esse relógio nem faz tac
Espero a hora do alarme
Pra ver um pouquinho de Sol
Indo pra casa na mesma rotina
homem, mulher, menino, menina
Apertados no metrô lotado
Corpo resiste, rosto cansado
É a mesma expressão em toda parte
Paredes brancas e muito papel
Gente que virou só numeral
Daqui nem vejo o céu
A persiana tá fechada
Parece que chove lá fora
Aqui tudo se arrasta
Confiro novamente a hora
A tarde é longa e vasta
Um copo de café pra não dormir
Depois muitos após o primeiro
O tédio que persegue é o problema
Pelo ritmo, o sono é certeiro
Silêncio cortado por um telefonema
Mas a mente querendo fugir
Se sou refém desse relógio
Prisioneiro dos ponteiros
Quero antes os meus direitos
Que sair no necrológio
terça-feira, 29 de março de 2022
Feliz, cidade
Uma garça
voando na imundície
De um rio hoje esgoto
Procurando o que comer
Parada, olhando abaixo da superfície
Não mais flutuando no vazio
mas sim no lodo podre ignoto
Aquela fotografia urbana
No aniversário da cidade
Me fez pensar nos outros
Que vivem a mesma realidade
Muitos vivendo no lodo
Encarando a dura verdade
Fugindo da maré cheia
mas outros, bem poucos
Vivendo da desgraça alheia